Crónicas da terra
Muito mais que uma rolha
Entre maio e agosto. É neste período de tempo anual
que decorre uma das mais promissoras atividades do setor
florestal…o descortiçamento dos sobreiros! Falando-se sobre
cortiça, é quase obrigatório mencionar um dos produtos a ela
associados, a rolha, quase tão famosa quanto o líquido que protege,
sendo que a indústria vinícola absorve cerca de 66% de tudo o que é
produzido.
Apesar das dificuldades inerentes
ao setor, Portugal continua a ser líder mundial na exportação deste
produto, estimando-se que, em 2015, os valores obtidos atinjam os
mil milhões de euros. Não é à toa que a cortiça se costuma apelidar
de "Petróleo da nossa Pátria" ou "Jóia da Coroa dos nossos Recursos
Naturais". A verdade é que a cortiça é, sem dúvida, um dos
materiais mais ecológicos do planeta, com propriedades únicas
devido à sua estrutura celular, impossível de replicar
tecnologicamente, até hoje.
O interior da cortiça é composto
por uma colmeia de pequenas células de suberina, preenchidas com
uma mistura gasosa muito semelhante à do ar. Cada centímetro cúbico
de cortiça contém, em média, 40 milhões de células, o que significa
que numa única rolha de cortiça existem cerca de 800 milhões desta
unidade estrutural da vida. Esta matéria-prima perfeita, 100%
natural de origem vegetal, é leve, tem uma grande elasticidade e
resiliência voltando à sua forma original depois de ser submetida a
uma pressão, é impermeável tanto a líquidos como a gases, e por
isso não apodrece, apresenta uma baixa condutividade de calor, som
e vibração, e é muito resistente ao fogo, não fazendo chama nem
expelindo gases tóxicos durante a combustão.
Não admira, portanto, que se
canalizem esforços para a investigação, desenvolvimento e inovação,
e que se espere muito mais da cortiça para além da rolha. O uso
deste material para mobiliário, para a nossa região, não é
novidade, se pensarmos nos tradicionais tropeços de uso comum nas
casas de campo, mas o olho visionário de designers de renome
internacional, que viram na cortiça beleza e conforto, estão a
catapultar não só este produto como também o nome de Portugal.
Nenhuma área fica indiferente à
cortiça…mobiliário, vestuário, joalharia, cosmética, arquitetura,
construção, indústria, desporto, transportes, e até…indústria
aeroespacial. A NASA não poupa nos elogios a este material que é
tão nosso, e que agora é componente em escudos térmicos e placas de
revestimento das naves espaciais. Totalmente reciclável, não
podemos perder a oportunidade de contribuir para este processo…é
que cada sobreiro, com a sua longevidade de 200 anos, permite que
lhe seja extraído a cortiça, cerca de 17 vezes, mas apenas a partir
dos seus 25 anos pode ser descortiçado pela primeira vez. A sua
casca autorregenera-se naturalmente, havendo renovação constante da
sua produção. É um processo moroso, sem dúvida, mas esta árvore
sobrevive a diversas gerações, constituindo um hino à
sustentabilidade e uma autêntica bandeira da ecologia…bandeira essa
que podemos afirmar ter subjacente o verde e o vermelho da bandeira
nacional…